domingo, 10 de fevereiro de 2008

Minhas origens (III)

Quem foram meu pais?[1]

Minha mãe morreu tão jovem...
E na sua última agonia
Lançava um olhar maternal
E a todos os filhos pedia
Que continuassem unidos
Era tudo o que queria

Depois, com lágrimas no olhos,
O último olhar lançava
Aos filhos e ao marido:
A quem tanto ela amava!
E uma profunda saudade
Do seu amor ela deixava,
E a dor da separação
Que naquele lar ficava!

O meu pai: seu nome era João Batista Cavalcante. Filho de João Batista Alexandre Cavalcante e Maria da Conceição. Nasceu na Serra de Portalegre, no Rio Grande do Norte, depois de casado mudou-se para o município de Apodi. Fomos morar próximo à caatinga, num lugar chamado Caroba, propriedade de um pequeno fazendeiro de nome Manoel Senhor, mais conhecido por “Doutorzinho”.
O meu pai era muito humilde, falava pouco e não gostava de discutir. No caso de qualquer questão ele preferia perder.
Certa vez fez uma empreitada com “Doutorzinho” para cortar umas estacas de jurema preta, pra fazer uma cerca de arame. Trabalhou muitos dias, cortando de machado, um total de setecentas estacas. Não teve sorte. Na hora de entregar a madeira, a fim de receber o dinheiro, o patrão condenou tudo e disse que não pagava. Meu pai, com toda a sua humildade, baixou a cabeça e saiu sem dizer nada, e o vilão, depois de condenar a madeira, fez uso dela na mesma obra que ia fazer.
Meu pai viveu em união com minha mãe mais ou menos uns vinte anos, quando ela veio a falecer de parto. Era o décimo quarto, que desta vez foi duplo. Morria com 35 anos, 15 filhos, 8 sobreviventes. Acredito que estes 20 anos de convivência com ela foi uma união perfeita.
Minha mãe tinha gênio muito forte; meu pai, pelo contrário, uma paciência de Jó, sempre evitava discussões. Ambos tinham grande amizade em toda aquela região. Ele muito honesto e muito honrado. A maioria dos comerciantes e fazendeiros eram seus compadres e depositavam nele inteira confiança.
Quando minha mãe morreu em 1923 eu contava mais ou menos 12 anos, mas já observava a convivência dos dois, era uma união perfeita, nunca vi os dois discutirem. Minha mãe cuidava dos filhos e da luta da casa; à noite, antes de dormir, ensinava a todos a rezar. As orações da primeira comunhão aprendi com ela, quando criança.
Eis os nomes de alguns amigos de meu pai: Sr. Antônio Melo, fazendeiro; Sr. Zeca Melo, fazendeiro e comerciante; Sr. Severino Melo, fazendeiro e lojista; e, ainda, o maior fazendeiro da região, o Sr. Bevenuto Holanda, que era nosso parente, de quem o meu pai foi morador pelo resto da vida. O Sr. Bevenuto era considerado o patrão do meu pai, mas apenas morávamos nas terras dele, pois o nosso trabalho era na caatinga, em terras do Governo, onde não se pagava nada.
O Sr. Bevenuto possuía cerca de 60 moradores, mas não sujeitava ninguém a trabalhar pra ele. Convidava aqueles que queriam trabalhar, pagava diária e ainda dava o almoço e o jantar.
Meu pai plantava milho, feijão e algodão. Fim de inverno, depois de colher a safra, ia para a Serra de Portalegre trabalhar nos engenhos de cana, era mestre de fazer rapadura, e por lá ficava até o mês de outubro, depois voltava e começava a preparar as terras para o novo plantio.
Passou pouco mais de um ano viúvo, casou com uma moça idosa, de nome Maria Luiza. Ela era bastante temperamental, completamente diferente da minha mãe. Mas, devido à paciência dele, tiveram vida normal por vários anos, quando ele veio a falecer. Apesar do jeitão esquisito, me tratava como se fosse seu filho. Era uma boa madrasta.
Depois que meu pai morreu, ainda fiquei em casa quase dois anos, cuidando de tudo e pagando as dívidas que havia contraído com a doença dele. Em pouco mais de um ano casei-me e recomecei nova vida.

[1] Embora diga que não, mas cita mais amiúde detalhes de seu pai, enquanto que de sua mãe parece que lembra pouca coisa, a não ser o seu temperamento, os filhos que teve e sua morte. Seu nome era Maria Nunes de Araújo. Nascera provavelmente em 1888.

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