Continuamos a narração das memórias do Sr. Batista:
- Como perdi o meu primeiro dinheiro com fiado
Logo depois que comecei a negociar, veio morar vizinho a nós um funcionário dos Correios, de nome Manoel Pereira. Chegou, deu-se a conhecer e pediu pra fazer umas compras fiado, que pagaria no final do mês quando recebesse o salário. Não hesitei em vender, já que se tratava de um funcionário público, ordenado seguro, e um freguês a mais. Passaram-se trinta dias até que saísse o seu pagamento. Nessas alturas estava devendo Cr$ 500,00, que representava quase um quarto do meu estoque de mercadorias. Pois bem, findo o prazo eu estava ansioso para receber e fazer novas compras, mas o homem não apareceu. Veio uma moça, sua cunhada, avisar que ele tinha entrado de férias e viajado, mas logo que voltasse viria pagar o débito. É claro que não continuei vendendo para ele. Mas quando voltou não compareceu para pagar, e em seguida mudou-se para outro bairro. Até aí não me preocupei muito, pois todas as noites me encontrava com o dito na porta do edifício dos Correios.
Passaram-se doze meses sem que nada conseguisse. A paciência estava se esgotando. E em conversa com um amigo, este aconselhou-me a recorrer ao diretor da instituição, quem sabe ele atenderia?
Era o Dr. Ismael Machado. Fiz-lhe uma carta explicando o caso e pedindo a sua ajuda. Respondeu-me, de forma bastante cordial, que não podia descontar diretamente da folha do funcionário, pois era contra a lei; mas chamaria a atenção do devedor e o aconselharia a ir pagar a dívida.
Fiquei aguardando. E de fato, no fim do mês, quando recebeu o dinheiro, veio direto falar comigo, mas chegou completamente embriagado. Foi entrando e dizendo: “O senhor deu parte de mim ao Diretor!” Respondi-lhe que sim, “tentei resolver com você, como não foi possível, apelei para o seu chefe!” Disse-me, pois: “Eu nem paguei, nem vou pagar”, completando em seguida, “porque você é um ladrão!”. Fiquei olhando para o bêbado com a cabeça cheia de pensamentos ruins, e depois de refletir por alguns segundos, com um nó preso à garganta, falei-lhe: “Manoel, você tem razão, eu sou ladrão mesmo, roubei da boca de meus filhos para dar a um sujeito sem vergonha como você para beber de cachaça”; e aí, já com mais raiva, emendei com uma voz mais repreensiva: “Agora, retire-se imediatamente da minha porta antes que lhe arrebente a cara!” Baixou a cabeça e foi embora pra nunca mais. E desse modo, acabei por perder o meu primeiro dinheiro com fiado.
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