O papel das “redes sociais” numa nova fase da Revolução
(*)
O “modelo” da Revolução da Sorbonne (Paris, maio de 1968)
foi facilmente disseminado pelo mundo. Com base naquela matriz ideológica, diversos
grupos realizaram ações revolucionárias em várias partes do planeta.
No Brasil, como alhures, a técnica de conduzir a opinião
pública é sempre a mesma. O sucesso obtido na Sorbonne de 68 tem inspirado
muita gente a repetir a façanha.
Hoje, no entanto, tudo indica que as diversas revoluções
similares que explodem em várias partes do globo conduzem a uma tentativa de
universalizá-la mais ainda. Sendo universal, é necessário que haja unidade,
pelo menos entre os agentes revolucionários. Por enquanto, a universalidade
está nos meios e nos métodos de ação, mas tende a sê-lo também no campo
ideológico, dos propósitos. Somente a unidade fará com que se obtenha mais
êxito universal.
Quanto aos métodos, tivemos, por exemplo, as diversas
manifestações de descontentamentos eclodidas entre os árabes e na Europa,
depois transplantadas para os Estados Unidos da América e os países
sul-americanos. Para atrair a simpatia do público revestiram-nas com o título
de “indignados” e “primavera árabe”. Como o ato de indignar-se não identifica
em si disposição para a revolução e o caos, mas uma atitude de revolta contra
as injustiças, logo os revolucionários atraíram a simpatia de certo público e
conseguiram, inclusive, derrubar alguns governos ditatoriais. Com uso
das armas, inclusive. Na Europa, é claro, tinha que ser diferente. E nos
Estados Unidos mais ainda, com outra roupagem, outro nomes, mas com propósitos
meio indefinidos, próprios desse tipo de revolução. Dentro do grupo “Ocupem
Wall Street”, como não poderia deixar de ser, o tema principal é a guerra
contra os bancos e o capitalismo dito “selvagem”, uma velha e surrada tese
marxista de luta de classes.
E agora a coordenação desse movimento está muito mais ao
alcance de todos, pois, diferentemente de maio de 68, temos a internet com as
redes sociais que divulgam celeremente as ordens, os contatos, as decisões e os
programas predeterminados.
O "milagre" da
“Revolução Espontânea”
Um das
características que os faz atraentes para o público é o cunho da espontaneidade.
A espontaneidade está produzindo um dos maiores “milagres” da História. Em primeiro lugar, produziu o "milagre" da geração espontânea do Universo, hoje um dogma evolucionista sempre presente
não só entre pseudo-cientistas mas na cabeça de muitos leigos e da quase
unanimidade da mídia. Ora, se o universo surgiu por “geração espontânea”, por
que não também as revoluções?
E foi assim que o
Protestantismo, a Revolução Francesa e o Comunismo brotaram “espontaneamente”
do chão e produziram essa monstruosa Revolução que hoje campeia pelo mundo
moderno. Foi dessa forma também que brotou a revolução da Sorbonne de 1968, uma
das revoluções mais “espontâneas” de toda a História, aliás a que mais se
caracterizou pela espontaneidade. É uma qualidade que pretende dá crédito e
autenticidade ao movimento.
Veio agora a
revolução dos “indignados” (ou dos indignos), produzida e gerada “espontaneamente”
em vários países do mundo. “Esponaneamente” brotou ela em solo árabe (fruto das
“redes sociais” da internet, segundo dizem) e de lá foi transplantada sua
semente para a Europa, Estados Unidos e o resto do mundo. Entre os árabes produziu quedas de governos,
mas não tinha como objetivo visível colocar um sucessor à altura das aspirações
populares. A palavra mágica era “democracia” , coisa que aqueles povos só
poderão saber o que seja daqui a alguns séculos.
Uma das características dos povos muçulmanos é o grande
atraso em que teimam permanecer, recusando qualquer evolução social. Isso
ocorre por causa dos princípios religiosos, embora seja negado por alguns. Há
séculos que são dominados por clãs e por regimes tribais. A tônica do
noticiário é que as revoltas vão solucionar todos os problemas: basta que se
coloque outro grupo político no poder e se façam eleições. Fácil, né? Quem
garante que os políticos que vão suceder aos ditadores vão inaugurar um regime
realmente democrático? Quem garante que não vai ser mais uma sucessão de
ditaduras? Não se muda a cultura de um povo assim da noite para o dia.
A única novidade em toda essa onda é que a mídia está
trombeteando aos quatro ventos que tudo está sendo feito via internet. O que é
absurdo, pois muitas dessas revoltas estão sendo feitas por grupos armados,
como ocorreu na Líbia e está ocorrendo agora na Síria. Outra novidade é que o
movimento é apresentado ao Ocidente como exemplo de uma revolução toda virtual,
nascida espontaneamente dentro das chamadas “redes sociais”. Um mito, uma
mentira, como vimos acima ao comentar sobre a “espontaneidade” revolucionária.
No resto do mundo
é diferente. Sempre com o caráter de
“espontaneidade”, marcam uma data para se iniciar uma marcha de
protestos e, coincidentemente, a “espontaneidade” registra também hora, data,
local do encontro, e até mesmo algumas características que as manifestações
devem ter, como, por exemplo, ser composta de “jovens”, de estudantes, de
operários, etc., etc.
É tão bela e
admirativa essa “espontaneidade” que a revista “Veja” a elogia, numa de suas
últimas edições em que propaga a manifestação dos “indignados” brasileiros
contra a corrupção. A revista só não explica como é que, “espontaneamente”, a
manifestação teve forum de debates na internet, local, data e hora para ser
feita, além de se caracaterizar unicamente como um movimento apolítico (quer
dizer, sem partido) e dirigido contra os corruptos. E, depois, teve a mídia que
“espontaneamente” vai lhe colocando no foco dos acontecimentos. É muita
“espontaneidade” para um movimento tão bem organizado e de caráter universal...
Alguns dos
anarquistas, aqueles mesmos que vivem num mundo virtual a procura de algo para
sair de seu “autismo consentido” para o mundo real, o qual eles odeiam porque
não o suportam, se aproveitam para “espontaneamente” botar fogo em tudo,
queimar veículos, depredar lojas, jogar pedras na polícia, e aí ameaçam
estragar o movimento. Que deve ser espontâneo mas não deve assustar.
O processo se
assemelha em tudo ao da Revolução da Sorbonne de 1968, um espécie de ensaio
geral para essa revolução que agora pretende ser mais universal ainda. Lá também ninguém
visava a derrubada do poder, pois é o próprio poder que eles odeiam; tudo era
feito de forma a parecer que a revolução brotava espontaneamente dos estudantes
e operários, inclusive até mesmo as frases e manifestações escritas eram as
mais rústicas possíveis (apenas pixações e nada de manifestos escritos ou de
pasquins) para se dar a idéia de que aquilo não provinha de uma preparação
prévia feita por um grupo revolucionário.
Para quem analisa
as coisas friamente, não parece que essa revolução dos “indignados” se
assemelha em tudo à da Sorbonne, em Paris, de maio de 1968?
Os “excessos”,
dizem, não fazem parte dessa impressionante “espontaneidade”, pois em geral são
cometidos por grupos isolados e radicais. Mas o que vemos é que os excessos são
tão comuns, que parecem até ser espontâneos, agora de verdade. Vejam o que vem
ocorrendo nos Estados Unidos e na Europa, em particular na Itália. Lá também
houve excessos, como este publicado pelo jornal Corriere de la Sera, em que um
grupo de anarquistas quebra uma estádua da Madonna, Nossa Senhora de Lourdes. O
jornal fala da “guerrilha de 15 de outubro”, porque na verdade houve uma
espécie de guerrilha dos manifestantes contra a polícia. O responsável pela
blasfêmia foi um grupo anarquista denominado “black bloc”, em tudo semelhante
aos demais, até mesmo na “espontaneidade” com que se organizaram, saíram juntos
para a rua e fizeram sua parte. E como é que tais grupos se organizaram em
outros países, como o Brasil? Espontaneamente?
A imagem, de
gesso, era venerada no salão paroquial de São Marcelino e São Pedro, cujo
pároco, o padre Pino Ciucci, disse que a aquela ação foi pior do que a dos
fascistas. Para atuar, o grupo “black bloc”, com o rosto coberto com gorros de
lã preta, capacetes e paus negros, invadiu o salão paroquial em meio às
manifestações dos “indignados” que ocorriam nas imediações, deixando
“espontaneamente” o local para que se diga depois que o vandalismo também é uma
ação “indignada” do povo contra a Religião. No final, via-se a imagem de Nossa
Senhora de Lourdes totalmente despedaçada na calçada, objeto de fotógrafos,
curiosos e passantes... Um crucifixo também foi profanado...
O arcebispo de
Milão, Angelo Scola, logo se manifestou sobre o crime, considerando-o muito
grave. O prelado previu coisas mais graves perante o fanatismo das turbas que
se manifestam em Roma. Mal sabia aquele bispo que apenas se iniciava ali a
formação deste grupo de caráter internacional.
Uma frustrada
tentativa de repetição da Sorbonne-68
A “revolução dos
indignados” está ainda em curso, embora tenha recuado muito no decorrer deste
ano: tudo indica que essa Revolução não avança, mas murcha. Não queremos dizer
com isso que a ação desses grupos estancou, mas sim que não encontra eco no
restante da população. Trata-se, sempre, de uma minoria isolada, que não
encontra apoio popular em geral. Veremos por quê.
Em São Paulo,
tivemos um exemplo flagrante disso ocorrido no final de 2011. Dentro do Campus da USP houve um crime e a
droga corria solta. O reitor resolveu chamar a polícia, como é óbvio, para
policiar o recinto das faculdades. “Indignadas” com a ação da reitoria, várias
organizações estudantis resolveram protestar: a polícia teria que vigiar a
“cracolândia”, a USP não, segundo palavras excitadoras do movimento ditas pelo
ministro da Educação.
No entanto, feita
uma reunião, a maioria resolveu concordar com a ação da polícia. Primeira
derrota dos “indignados” revolucionários, os quais, insatisfeitos, resolveram
agir contra a maioria. Cerca de 100 alunos (uma minoria irrisória) invadem o
prédio da Faculdade de Filosofia. Esperavam que os outros estudantes o apoiassem,
mas em vão: a grande maioria, em reunião, decide a desocupação do prédio. Aí,
então, cerca de 70 remanescentes daqueles 100, ao sair da Faculdade de
Filosofia resolvem invadir o prédio da própria reitoria. Desta vez, porém, o
reitor resolve acionar a justiça, a qual dá um ultimato aos invasores para
desocupar o prédio. Como não o fizeram, foram expulsos pelos policiais. Esta
última ação ocorreu no dia 8 de novembro de 2011.
No dia seguinte,
os grupos revolucionários fazem nova tentativa de conquistar a adesão dos
estudantes e proclamam uma greve em protesto contra a ação policial no recinto
da USP. Nova derrota. Não há adesão ao movimento, o qual mingua por falta de
participantes. Será que esperavam ocorrer o mesmo que na Sorbonne de maio de
68, quando uma minoria invadiu uma faculdade, depois a própria universidade,
passando posteriormente para as ruas e as fábricas? Pode ser que não, pelo
menos entre os indivíduos de base, mas em todos os outros movimenos semelhates
havidos em outras partes do mundo, inicialmente há sempre uma causa pequena e
de pouca repercussão, para, depois se partir para uma questão nacional e até
internacional, que é o escopo dos líderes. Esta, da USP, foi um fiasco total.
Uma
particularidade, que a mídia chamou a atenção desde o início desse movimento:
os invasores da reitoria da USP são, na maioria, filhos de gente rica ou de
classe média. Alguns dos pais foram até à polícia para protestar dizendo que
estavam sendo vítimas de perseguição política. Eles pleiteavam o “direito” de
seus filhos fumarem maconha no recinto da USP e acusam a justiça de
“perseguição política”.
Um movimento de elite
O que reflete bem
o tipo de ação promovida nos bastidores por gente desse tipo é retratado pelo
jornal “Folha de São Paulo” ao relatar o seguinte episódio:
“Quinze socialites se reuniram anteontem à tarde,
nos Jardins (zona oeste), para debater o combate à corrupção e outros temas.
Antes mesmo de começar, a pauta já era outra.
“Ei, menino, sabe que fim deu a confusão da USP?”,
assuntou uma das integrantes do Grupo Ação em Cidanania à reportagem. PMs
haviam retirado, horas antes, os invasores da reitoria.
Iniciada a reunião pela psicalanista Maria Cecília
Parasmo – regada a refrigerante, bolacha e bolo -, o debate ficou em torno de
como “mobilizar o povo” e “para quê”.
Para Ana Paula Junqueira, pré-candidata do PMDB a
vereadora, o brasileiro deveria se inspirar na Primavera Árabe..
Quando o tópico voltou para os conflitos na USP,
os ânimos se exaltaram. A historiadora Maria Cecília Naclério sugeriu que o
grupo de invasores teria ligação com máfias (“tudo isso é orquestrado”).
Já a presidente da Associação de Mulheres de
Negócios, Márcia Kitz, questionou se a PM não deveria ter sido mais incisiva,
com uso de bombas de efeito moral e jatos d’água.
Após publicação de Vídeo pela TV Folha, ontem, o
termo “socialites” ficou entre os mais comentados no Twitter em SP”. (v. Folha de São Paulo, 10.11.2011, caderno
Cotidiano, C3).
A queda da
disponibilidade revolucionária
Estar disponível
é ter um espírito propenso e pronto para a ação. O chamado “mundo virtual” tira
um pouco esta disponibilidade, pois enclausura as pessoas numa espécie de
“autismo consentido” e numa acomodação egoística. No entanto, torna as pessoas
mais manipuláveis.
O que deve ser
manipulado pela Revolução? A mesma disponibilidade para a ação, a ação
coordenada e universal, assim como a unidade da ação. As pessoas manipuláveis
devem agir por impulso, sem raciocinar bem o que estão a fazer nem o seu
conteúdo ideológico. Em geral as pessoas são manipuláveis por questões
sentimentais, compulsivas, financeiras, etc.
Mesmo assim, tal
manipulação tem encontrado muitas dificuldades. Uma delas é que o “mundo
virtual” ainda é vivenciado por uma minoria da população, pelo menos em tempo
integral. E parace que saturou, não indicando que há para onde crescer mais do
que o que já crescreu. Assim, os próprios agentes da manipulação podem ser
atingidos pelo parasitismo virtual. As redes sociais funcionam mais como
necessidade que as pessoas têm hoje, num mundo tão isolacionista, de se
comunicarem, mas parece que não tem surtido muito efeito quando se pretende por
ele a ação das massas para promover uma revolução tendenciosa.
A Revolução e
a auto-regência dos seus lideres
Um líder
revolucionário, apesar de em geral ter que ser carismático, perde sua
auto-regência ao se entregar inteiremente às paixões revolucionárias. Estas
paixões, virulentas e irracionais, tendem a obscurecer o “lumen rationis”(a luz
da razão), transforando-os em meros autômatos. Também os líderes podem ser
influenciados pela tendência a agir por impulsos. É mais cômodo. Desta forma,
as lideranças revolucionárias hoje são raras, pois falta-lhes o que denominamos
acima de “disponibilidade revolucionária”, necessária para “tocar” a massa para
a ação. Um líder perde sua capacidade de liderança quando perde também sua
auto-regência, é sabendo governar-se que se governa os outros com eficiência.
Um dos recursos
que a Revolução pode usar, nesse caso, é da ação integrada, liderada não por um
individuo mas por um grupo, um “comitê”, um soviet. Recurso já usado na
Sorbonne para se dá a idéia de que as decisões não são individuais, mas
coletivas. Mas esse grupo precisa se utilizar de recursos com que possa mover a
“massa” na direção revolucionária. Nesse caso, a técnica mais apropriada (já
usada em várias ocasiões) é a “acupuntura social”, pela qual as massas vão agir
impulsionadas por fatos ocorridos e provocados de propósito que as levem em
direção diferente e até oposta daquilo que pensam e vivem. Um exemplo foi a
eleição ganha pelo partido socialista espanhol em 2004, fruto de um atentado
terrorista. O atentado foi feito pelos terroristas muçulmanos, mas levou a
opinião pública a desviar seus votos contrários ao governo conservador, então
no poder, dando vitória aos socialistas. Assim, sem um discurso, sem ação de
nenhum líder, mas de um grupo, o povo foi levado a agir de forma diferente e
até contrária ao que pensava.
Uma das características dos povos muçulmanos é o grande
atraso em que teimam permanecer, recusando qualquer evolução social. Isso
ocorre por causa dos princípios religiosos, embora seja negado por alguns. Há
séculos que são dominados por clãs e por regimes tribais. A tônica do
noticiário é que as revoltas vão solucionar todos os problemas: basta que se
coloque outro grupo político no poder e se façam eleições. Fácil, né? Quem
garante que os políticos que vão suceder aos ditadores vão inaugurar um regime
realmente democrático? Quem garante que não vai ser mais uma sucessão de
ditaduras? Não se muda a cultura de um povo assim da noite para o dia.
A única novidade em toda essa onda é que a mídia está
trombeteando aos quatro ventos que tudo está sendo feito via internet. O que é
absurdo, pois muitas dessas revoltas estão sendo feitas por grupos armados,
como ocorreu na Líbia e está ocorrendo agora na Síria. Outra novidade é que o
movimento é apresentado ao Ocidente como exemplo de uma revolução toda virtual,
nascida espontaneamente dentro das chamadas “redes sociais”. Um mito, uma
mentira, como vimos acima ao comentar sobre a “espontaneidade revolucionária”.
(*) A análise da Revolução, como feita acima, é baseada nas
teses da obra “Revolução e Contra-Revolução”, do Prof. Plínio Corrêa de
Oliveira, cujo texto pode ser obtido aqui:
http://www.pliniocorreadeoliveira.info/livros.asp