terça-feira, 29 de agosto de 2023

A CLASSE MÉDIA

 




Fala-se muito hoje em dia em preconceito social. Pois bem, pertenço a uma classe social desprezada e entregue aos odiosos preconceitos sociais: trata-se da classe média.  Não vou aqui querer estabelecer algum parâmetro de quem pertence ou não a esta classe, informando, por exemplo, qual seria a renda mensal própria a ela. Nada disso. Poderei cometer o mesmo erro de certos economistas, como os do PT, que afirmam que uma renda superior a dois salários mínimos, por exemplo, classifica o sujeito como classe média. Dizem  também que quem ganha acima de R$ 350,00 por mês não passa fome. Esta generalização de critério é falsa. Quem ganha dois salários mínimos e mora em São Paulo, se for casado e tiver filhos, passa fome. Mas, se morar, por exemplo, em qualquer cidadezinha do sertão nordestino poderá até ficar um pouco mais tranqüilo. E se ganhar apenas R$ 350,00 acho que nem ma floresta amazônica o cara consegue ter uma vida digna.  Então, nada de parâmetros generalizadores. 

Também o patrimônio não poderá servir de parâmetro.  O sujeito pode ser milionário, quer dizer, possuir um patrimônio de dois milhões ou mais, mas não usufruir nenhuma renda do mesmo. Pode até passar fome, pois existem muitos patrimônios que só dão prejuízos e endividam o possuidor. 

Podemos apenas deduzir que pertence a esta classe quem ganha um pouco mais do que o comum da população e trabalha para manter um padrão de vida digno, ou até mesmo acima do normal. A palavra “trabalha” diz tudo. Trata-se, portanto, de uma classe trabalhadora. 

Graças a esta classe uma multidão de gente de classes mais humildes consegue viver. Sustentamos os empregados domésticos, os porteiros de apartamentos, os frentistas de postos de gasolina, os coletores de lixo, os vendedores ambulantes e até os flanelinhas. Ainda sobra um dinheirinho para ajudar alguma sociedade de filantropia ou alguma família desamparada. 

Mas não é só isso. Sustentamos também as empresas de serviço público, de luz e água, e de esgotos. Graças à nossa classe social existem boas escolas no país, ajudando o próprio governo no problema da educação. Também sustentamos uma boa quantidade de empresas de planos de saúde, tirando do governo a obrigação de nos dá assistência médica pública, por sinal muito ruim.

Sim, mas a classe média vai mais longe. É ela a que  mais paga impostos, ou tirados de seus salários em descontos diretos ou então através dos chamados impostos indiretos embutidos nas mercadorias que compra. A cesta básica de quem mora num bairro de classe média é muito mais cara do que quem mora em bairro pobre, pois os preços são bem mais altos, pagando-se, portanto, mais impostos e encargos sociais. Por causa disso, sustentamos também milhares de políticos que administram nosso país, pois é com os impostos que pagamos que eles recebem seus salários, e também roubam.  

Até os bancos se mantêm graças à classe média, pois é ela que consegue manter reservas guardadas em quantidade suficiente para que eles obtenham seus lucros. Na área financeira é a classe média também que faz funcionar os cartões de crédito e sistemas de crédito espalhados pelo país. 

A classe média também sustenta uma infinidade de atividades de lazer, como bares, lanchonetes, hotéis, empresas de transporte aéreo e terrestre. Faz o turismo produzir milhares de empregos. 

Vamos fazer uma análise de uma situação imaginária, comparando quanto paga de impostos alguém de classe média, que ganhe em torno de R$ 6.000,00 por mês, em confronto com uma empregada doméstica que trabalha em sua casa e ganha, por exemplo, R$ 1.000,00 por mês. Colocamos este valor em números redondos para facilitar os cálculos.

1. O patrão, nesse caso um assalariado também, paga, além de IR (entre 18 a 20%), Imposto Predial, licenciamento de veículo, seguros, luz, água e telefone, condomínio, escola para os filhos, plano de saúde, remunera a própria empregada doméstica e mais algum outro trabalhador que possa manter a seu serviço;

2. Com o salário que a mesma recebe de um sujeito classe média ela paga simplesmente INSS, que é apenas 8%, não estando sujeita a nenhum de outros tributos, inclusive, se possuir imóvel próprio, está isenta de IPTU (isenção  dada em muitas cidades por ser de pouco valor), e também do pagamento de contas de luz em alguns casos; a mesma pode não ter direito, mas haverá sempre alguém desempregado em sua casa que recebe gratuitamente o “vale gás”, o bolsa família ou qualquer outro benefício social dado pelo governo; coisa que, em nenhuma hipótese, alguém da classe média tem acesso; 

3. Sim, mas há os impostos indiretos, embutidos nos produtos e nos serviços adquiridos. Poder-se-ia dizer que os produtos da cesta básica de uma pessoa de classe humilde  recebem a mesma tributação de outros comprados por uma da classe média, mas não é verdade. No primeiro caso, a nossa empregada doméstica, por morar em bairro pobre, paga menos pelas mercadorias de consumo próprio e, por isso, menos impostos. 

Não entendo por que razão tanta gente na mídia e economistas famosos andam dizendo por aí que quem paga mais impostos é a classe pobre. Onde?

segunda-feira, 28 de agosto de 2023

HIPOCONDRIA SOCIAL

 



Mania ou paranoia por doenças. Isso seria a denominação de um sintoma de comportamento social, aliás muito em voga hoje. Minha mãe tinha algo disso, pois invariavelmente tinha que ir aos médicos por qualquer sintoma que sentisse, por menor gravidade que fosse, sempre julgando que a coisa estava pior. Certo dia ela foi consultada por um médico e o mesmo lhe disse que ela nada tinha, estava em perfeita saúde, ao que ela respondeu: “Como não estou doente? O senhor é médico coisa nenhuma! Vou procurar outro médico!”  Esse tipo de personalidade, ou melhor, esse tipo de comportamento social tornou-se não somente muito comum nas pessoas de hoje, mas uma verdadeira febre, algo assustadoramente dominante.

De tal sorte que foi uma das principais motivações do pânico criado na pandemia do Covid: a hipocondria social serviu para causar pânico na sociedade, o que ocorre até hoje.

Sei que há tal mentalidade, pois convivo com algumas pessoas que sofrem de tal fenômeno,  mas nunca tinha convivido com alguém infestado dela de uma forma tão intensa como estou vivendo agora.  Já vi muitos que tiram os sapatos ao entrarem em casa, deixando-os na porta de entrada, tomando uma infinidade de remédios após alguns espirros, exagerando na limpeza geral do corpo ou das roupas, etc., mas nunca tinha algo igual ao que presencio agora.

Quando essa pessoa apareceu na minha casa estava de máscara, apavorada ainda por causa da pandemia. Mas julguei aquilo como coisa normal, pois há muitas pessoas que ainda pensam que a pandemia ainda persiste, embora se saiba que há mais de dois anos que o vírus foi embora ou se transformou em outros. Mas, quando os dias foram se passando essa pessoa começou a revelar outros comportamentos estranhos.  Muito ciosa da limpeza carrega uma enorme bagagem de produtos essenciais e até exageradamente essenciais para o asseio corporal.  Quando se levanta, ainda de manhã (não cedo, porque corda sempre tarde), carrega sua maletinha para o banheiro e demora horas em seus asseios. De longe a gente ouve por vários minutos o barulho da escovação dos dentes. Mas não para por aí, seguido de outros procedimentos que a gente não sabe quais são, mas certamente são pastas ou pomadas com finalidades de proteção da pele e outros fins.

Sua comida é feita por ela mesma, pois teme as refeições feitas por outras pessoas que poderiam lhe trazer doenças. Guarda uma enorme quantidades de potes plásticos na geladeira contendo alguns produtos, os quais desconheço o que são. Se vai pra rua passar da hora do almoço, leva sempre uma marmitinha com aquela comida especial.  Não sei o que contém ali, mas ela mesma vive falando que não come tal coisa e tal outra porque faz mal. Por exemplo, não come carne. É vegetariana.  Certo dia lhe adverti que tomasse cuidado com as comidas vegetais, pois aqueles produtos vêm da fonte produtora contendo muitos micróbios ou outros elementos nocivos à saúde. Ao que ela respondeu que todos seus produtos são de origens naturais e não fazem mal à saúde. Não adiantava argumentar, a coisa leva até o fanatismo.

Sua roupa é ela mesma que lava, pois tem que ser uma lavagem especial a fim de não deixar nenhum resquício de impureza ou vírus da rua. Assim, chinelos, sapatos, roupas, objetos de uso pessoal (até os brincos ou pulseiras?) só usa raramente os seus, não tocando nos das demais pessoas com receito de se contaminar.

Ao deitar-se corre o olhar pelo quarto para ver se há algum mofo ou mau cheiro nas paredes. Para proteger-se disso usa um produto que produz com cheiro no ar e evita, segundo ela mesma, os maus odores e os micróbios tão comuns nas paredes úmidas.

Muitos dos cuidados de minha hipocondríaca não estão relatados porque ela não os disse todos ainda, mas imagino que chega ao exagero. Por exemplo, a vi batendo os pés com força no chão, mas de uma forma forte e exagerada. Pensei até que tinha tomado um tropeço. Mas, ela mesma disse que batia os pés daquela forma, com força e demoradamente, a fim de retirar deles a poeira ou qualquer sujeira que possa entrar dentro de casa.

Se a alma dela, quando morrer, puder sentir o mal cheiro que vai exalar seu cadáver vai sofrer muito mais do que quando vivia , pois essa hipocondria doentia poderá ultrapassar os limites desta vida e invadir a outra.

Eis um exemplo de um mal social muito divulgado e praticado hoje: HIPOCONDRIA SOCIAL