Na sociedade perfeita, como devem se comportar os bons
“Eu dormia quando sonhava que a vida feliz consiste em gozar; acordei quando verifiquei que o gozo da verdadeira felicidade consiste em servir”. (anônimo).
Um dos princípios primordiais da perfeição cristã, que é a prática da Bondade, encontra-se nesta frase do Evangelho:
“Vós sabeis que os príncipes das nações as subjugam e que os grandes as governam com autoridade. Não será assim entre vós, mas todo o que quiser ser entre vós o maior, seja vosso servo; e o que quiser ser entre vós o primeiro, seja vosso escravo; assim como o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida para redenção de muitos” (Mt 20, 25-28).
Nisto consiste a felicidade aqui na terra: servir ao próximo. Servir, dedicar-se, imolar-se, e renunciar a tudo em benefício dos outros, eis a verdadeira felicidade. Muitos pensam que a felicidade consiste em ter tudo. Pelo contrário, ela consiste em que se dê tudo e por inteiro.
Vejamos um exemplo, também tirado do Evangelho. Um jovem rico, que praticava uma certa bondade, sentiu em seu coração desejos de atingir graus maiores de perfeição e foi ter com Nosso Senhor para que Ele lhe instruísse. Note-se que o jovem se dirige a Jesus Cristo O chamando de Mestre: “Eis que, aproximando-se dele um (jovem), disse-lhe: Mestre, que hei de eu fazer de bom para alcançar a vida eterna? Jesus respondeu-lhe: Por que me interrogas acerca do que é bom? Um só é o bom”. Sim, por que perguntar que se deve fazer de bom? Porque havia em seu coração desejos de bondade, postos pela graça de Deus.
Quer dizer, Bom só Deus, a Perfeição última da Bondade. Mas havia uma maneira humanamente possível de ser bom como Ele: a prática de seus Mandamentos: “Porém, se queres entrar na vida, guarda os mandamentos. Quais? perguntou ele. E Jesus disse: “Não matarás, não cometerás adultério, não roubarás, não dirás falso testemunho. Honra teu pai e tua mãe, e ama o teu próximo como a ti mesmo”. Este é o princípio elementar de qualquer bondade, o primeiro e básico, ou os dois primeiros graus referidos acima.
Mas isso aquele jovem já julgava que praticava a contento e por isto foi adiante, pois tinha desejos de maiores perfeições: “Disse-lhe o jovem: Tenho observado tudo isso desde a minha mocidade. Que me falta ainda?” Sim, o que é necessário para ser mais perfeito? O que resta para atingir um grau de bondade maior? Ao fazer a pergunta aquele jovem dá a entender que recebeu uma graça interior de desejar maior perfeição. “Jesus disse-lhe: Se queres ser perfeito, vai, vende o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu; e (depois) vem e segue-me. O jovem, porém, tendo ouvido esta palavra, retirou-se triste, porque tinha muitos bens.” (Mt 19, 16-22).
Por esta ele não esperava. Seus sonhos de perfeição esbarravam num enorme obstáculo, seus bens, e ele nunca imaginava que a renúncia deles era um passo maior para ser mais perfeito, atingir uma bondade mais alta. Vejam que no conselho de Nosso Senhor a bondade deverá ir sempre aumentando, a fim de atingir o último grau:
- Primeiro passo: vender tudo o que possui. Isto requer uma total renúncia aos bens terrenos, um total desapego ao gozo deles e uma grande confiança na Providência divina. Uma pergunta deve ter lhe assaltado: de que viverei eu, então? Nem se fala por enquanto na boa ação que ele faria aos pobres, isto vem depois. O primeiro passo dado é em benefício da própria alma ao praticar as virtudes heróicas acima: desapego aos bens, combate ao vício da avareza e confiança em Deus;
- Segundo passo: entregar aos pobres o produto da venda de seus bens. Pois só vender não seria suficiente para atingir um grau maior de bondade. Se ele vendesse e ficasse com os frutos da venda de nada adiantaria, pois com aquele dinheiro ele tornaria a adquirir tantos bens desejasse;
- Terceiro passo: vem (toma a tua cruz) e segue-me. Depois de vender tudo e dar o dinheiro (ou o fruto da venda) aos pobres, ainda assim não estaria completa a senda em busca da perfeição. Mais difícil do que isto seria ainda tomar a própria cruz, as incertezas do futuro, o sofrimento, o desamparo, a possível falta de socorro material. Mais difícil ainda seria seguir a Nosso Senhor, porque teria que enfrentar a opinião dos dominantes, teria que vencer o respeito humano, tornar-se amigo e seguidor daquele Homem tão odiado dos fariseus e quejandos para sofrer junto com Ele as perseguições que viessem. E estar preparado para morrer crucificado: aí estaria o máximo da perfeição, o último grau da bondade, que seria o martírio. O martírio como ponto alto de se ter doado e servido.
O jovem rico, ao ouvir tal conselho, saiu triste dali porque não era este o seu ideal de perfeição, não era assim que ele entendia a Bondade. Pensava talvez ele que havia um meio de acomodar sua vida apequenada e mesquinha com os mais altos desígnios de Deus e assim pudesse se salvar. E por causa disto, Nosso Senhor completou em seguida: “Em verdade vos digo que um rico dificilmente entrará no reino dos céus. Digo-vos mais: É mais fácil passar um camelo pelo orifício de uma agulha, que entrar um rico no reino dos céus” . Para não deixar os bons ricos desesperados, Nosso Senhor deu-lhes este consolo: “Aos homens isto é impossível, mas a Deus tudo é possível”.
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